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Brasil lidera destruição de florestas primárias tropicais

Em 2021, 15,5 mil km² foram devastados, o equivalente a 40% da perda registrada no mundo, mostra levantamento da Global Forest Watch. Ricas em biodiversidade, florestas tropicais têm papel vital na regulação do clima.

Área desmatada em Rondônia, em foto de setembro de 2021. Devastação aumentou no estado, assim como no Amazonas e no AcreO desaparecimento das florestas primárias tropicais úmidas em todo o globo segue em velocidade preocupante. Só em 2021, cerca de 37,6 mil km² foram destruídos, alerta uma análise da plataforma Global Forest Watch publicada nesta quinta-feira (28/04).

Grande parte dessa devastação ocorreu no Brasil: foram 15,5 mil km² perdidos no ano passado, o equivalente a 40% do total registrado no planeta, apontam os dados monitorados anualmente sob coordenação da Universidade de Maryland, dos Estados Unidos, e do World Resources Institute (WRI).

"Infelizmente, os dados têm uma certa previsibilidade. Eles mostram uma estabilidade na evolução [da perda florestal]", comenta sobre a liderança brasileira no ranking negativo Fabíola Zerbini, diretora de florestas, uso da terra e agricultura do WRI Brasil.

Desde 2016, o Brasil tem apresentado taxas de perda acima de 10 mil km², segundo informações da Global Forest Watch, que disponibiliza os detalhes numa plataforma online gratuita.

Essa avaliação independente é diferente daquela feita pelo Prodes, sistema de monitoramento anual do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). A primeira, além de adotar outra metodologia, abrange os meses de janeiro a dezembro. Já o Prodes considera o período entre agosto de um ano e julho do ano seguinte.

"Nós mostramos nossos dados para o Inpe, que faz um trabalho fundamental. Há diferenças, mas existe uma consistência histórica, ambos mostram aumento da tendência da perda de florestas", complementa Zerbini em entrevista à DW Brasil.

Mais valiosas e mais destruídas

As florestas tropicais úmidas estão próximas à linha do Equador, são ricas em biodiversidade e têm um papel vital na regulação do clima. Elas também são conhecidas por um outro fenômeno causado por atividade humana: o desmatamento.

"Essas florestas analisadas [primárias tropicais úmidas] têm alto valor ecossistêmico, uma grande importância para a agenda climática global, riquíssimas em biodiversidade. A perda delas gera um impacto negativo muito grande justamente por esse grande serviço que elas prestam para sociedade", aponta Zerbini.

Apesar de o levantamento atual apontar uma queda de 11% em relação à devastação registrada no mundo em 2020, que atingiu um dos maiores níveis desde 2002 (42 mil km²), a taxa de 2021 é considerada elevada e é praticamente a mesma das observadas em 2018 (36,5 mil km²) e 2019 (37,5 km²).

Na América do Sul, a Floresta Amazônica tem maior peso no levantamento feito pela Global Forest Watch. Depois do primeiro lugar disparado para o Brasil no quesito perda, a República Democrática do Congo vem em segundo lugar – mas bem abaixo do patamar brasileiro – com 5 mil km². Bolívia (2,9 mil km²) e Indonésia (20,3 mil km²) aparecem na sequência.

A perda em solo boliviano em 2021 foi a maior registrada desde o início da série, em 2002. Grandes áreas da Amazônia também foram devastadas no Peru e Colômbia, que aparecem em quinto e sexto lugares, respectivamente.

Embora ainda esteja na terceira colocação do ranking global, a Indonésia conseguiu, pelo quinto ano seguido, reduzir o corte e queima de florestas primárias. No país, a floresta é desmatada principalmente para dar lugar a plantações de palmeiras que fornecem óleo de dendê.

De 2002 a 2021, o planeta perdeu mais de 683 mil km² de florestas primárias tropicais úmidas, o que representa uma redução de quase 7% na área total desse tipo de vegetação, segundo a base de dados da plataforma.

Ilegalidade em alta no Brasil

No Brasil, houve aumento considerável de devastação nos estados amazônicos mais a oeste, como Amazonas, Acre e Rondônia. Muitos desses novos focos são clareiras em grande escala ao longo de estradas, o que, acredita-se, se trate de terreno aberto para pastagem do gado.

Embora a análise da Global Forest Watch se restrinja aos números, Fabíola Zerbini, do WRI Brasil, comenta sobre o contexto que impulsiona o corte e queima das árvores na Amazônia.

"Isso tem a ver com a precarização da fiscalização, das ações de comando e controle no campo, da redução do orçamento dos órgãos ambientais. Tudo isso gerou um ambiente onde a ilegalidade cresceu muito", argumenta.

Um levantamento feito pelo Observatório do Clima, rede formada mais de 60 organizações não governamentais e movimentos sociais, mostrou que as multas por crimes ambientais caíram 51% nos nove estados amazônicos em comparação com 2018, ano que antecedeu o começo do governo Bolsonaro. Em 2021, apenas 41% dos recursos destinados para fiscalização ambiental foram usados.

Falsa dicotomia entre riqueza e floresta

"A floresta em pé é o grande potencial que o Brasil tem nas mãos para enriquecer, e não o contrário. Isso vale inclusive para o próprio agro", afirma Zerbini. "É falsa essa dicotomia entre riqueza e floresta; agricultura e floresta. A agricultura, aliás, tem muito a ganhar com a floresta em pé. A destruição da floresta pode agravar a crise hídrica, o que representa um tremendo impacto de negócio para o agro", acrescenta.

Estudos recentes já mostram que o desmatamento e as secas mais prolongadas estão limitando a capacidade de a Floresta Amazônica se regenerar. Um estudo publicado na Nature Climate Change em março apontou que mais de 75% da floresta está perdendo estabilidade, principalmente na região sul.

Imagens de satélites dos últimos 30 anos analisadas mês a mês ajudaram os pesquisadores a concluir que essa situação ameaça todo o bioma e o aproxima do chamado tipping point, ponto de inflexão em que a Amazônia não consegue mais voltar a um estado de floresta tropical saudável.

Ameaça longe da linha do Equador

Fora dos trópicos, as florestas boreais registraram no ano passado o índice mais alto de perda, com aumento de 29% em relação a 2020. As maiores áreas devastadas estão na Rússia, com 65 mil km², arrasadas numa temporada de incêndios florestais sem precedentes.

O aumento da temperatura média global relacionado às mudanças climáticas deixa o ambiente mais vulnerável – e propício – ao fogo. À medida que as florestas queimam, mais dióxido de carbono é emitido para a atmosfera, levando a um clima mais quente e mais seco – o que, por sua vez, aumenta as chances de mais incêndios florestais.

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