″A ausência de dados também é informação″, afirmou gerente da Anvisa sobre a Sputnik VA diretoria da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) rejeitou na noite desta segunda-feira (26/04), por unanimidade, pedidos de autorização da importação da vacina russa Sputnik V no Brasil, por considerar que faltam dados técnicos para verificar a segurança e a eficácia do imunizante contra a covid-19.
"Jamais permitiremos que milhões de brasileiros sejam expostos a produtos sem a devida comprovação de qualidade, segurança e eficácia ou, minimamente, diante da grave situação que atravessamos, que haja uma relação favorável risco-benefício", afirmou Antônio Barra, diretor-presidente da agência.
Os cinco diretores da Anvisa seguiram a recomendação da área técnica da entidade, que identificou diversas "incertezas" em relação à segurança e à eficácia do imunizante. Produzida pelo Instituto Gamaleya, da Rússia, a vacina ainda não foi aprovada pela Agência Europeia de Medicamentos (EMA) ou pela Administração Federal de Alimentos e Medicamentos (FDA), dos Estados Unidos.
Nove estados tiveram seus pedidos de aquisição do imunizante avaliados pela Anvisa: Bahia, Acre, Rio Grande do Norte, Maranhão, Mato Grosso, Piauí, Ceará, Sergipe e Pernambuco. Além desses, também estão com pedidos pendentes de avaliação Rondônia, Sergipe, Tocantins, Amapá e Pará, e os municípios de Niterói (RJ) e Maricá (RJ). Ao todo, esses pedidos somam 66 milhões de doses, que poderiam vacinar cerca de 33 milhões de pessoas, por meio de duas doses.
Os pedidos analisados foram apresentados no fim do mês passado com base na Lei n º 14.124/21, que dispõe sobre medidas excepcionais relativas à aquisição de vacinas contra a covid-19. A lei determina que, na ausência do relatório técnico de avaliação de uma autoridade sanitária internacional, a Anvisa tem 30 dias para analisar pedidos de autorização excepcional de importação.
A Anvisa havia solicitado ao Supremo Tribunal Federal (STF) a suspensão do prazo de análise, mas o ministro Ricardo Lewandowski negou o pedido, determinando que a agência se pronunciasse até 28 de abril.
Antes da votação pelos diretores da Anvisa, gerentes de três departamentos da agência apresentaram pareceres técnicos contrários à Sputnik V.
Gustavo Mendes, gerente-geral de Medicamento e Produtos Biológicos da Anvisa, afirmou que em todos os lotes analisados foi identificada a presença de adenovírus replicante na vacina, ou seja, com capacidade de reprodução no corpo humano.
"Isso significa que o vírus [adenovírus], que deve ser utilizado apenas para carregar o material genético do coronavírus para as células humanas e promover a resposta imune, ele mesmo se replica. Isso é uma não conformidade grave", disse Mendes.
A presença de adenovírus replicante traz riscos à saúde. "Pode levar desde a infecções variadas até à exarcebação da resposta imunológica. Não temos informações sobre esse tipo de controle da Sputnik V", disse a diretora da Anvisa Cristiane Jourdan.
Segundo Mendes, a presença de adenovírus replicantes está em desacordo com os parâmetros para o desenvolvimento de vacinas de vetor viral estabelecidos por autoridades regulatórias da União Europeia e dos EUA.
Além disso, a Gerência Geral de Inspeção e Fiscalização da Anvisa informou que não foi apresentado pelas empresas que fabricam a Sputnik V um relatório técnico para verificar o controle de qualidade na produção.
Uma inspeção no Instituto Gamaleya, desenvolvedor da vacina, foi negada pelo governo russo, mas a Anvisa inspecionou duas fabricantes, a Generium e a UfaVITA. De acordo com a gerente de inspeção, Ana Carolina Merino, foram constadas não conformidades na fabricação que influenciam a garantia de esterilidade do imunizante, e que, portanto, a importação do produto não é recomendada.
Mendes também apontou haver uma falha no controle de qualidade quanto a possíveis impurezas na vacina. "A empresa não demonstrou que controla de forma eficiente o processo para evitar outros vírus contaminantes. Isso tem um potencial impacto na segurança das pessoas que forem vacinadas”, afirmou.
Suzie Marie Gomes, gerente-geral de Monitoramento de Produtos Sujeitos à Vigilância Sanitária da Anvisa, apontou ainda que faltam informações conclusivas sobre eventos adversos de curto, médio e longo prazos decorrentes do uso da vacina.
"A ausência de dados também é informação. A ausência de comprovação é considerada uma evidência, e uma evidência forte", disse.
Os diretores da Anvisa apontaram que a maior parte dos países onde a Sputnik V já foi aprovada não apresentou dados sobre a vacina, fora a Argentina.
Segundo um levantamento feito pela DW, a vacina russa já foi aprovada em pelo menos 60 países, bem como nos territórios palestinos e na República de Srpska (na Bósnia e Herzegovina). Isso inclui países de todo o mundo, como Índia, México, Irã, Gana, Sri Lanka e Sérvia.
A UE afirma que Hungria e Eslováquia também permitiram o uso da Sputnik V com aprovação nacional de emergência – embora o imunizante ainda não tenha sido aprovado pela Agência Europeia de Medicamentos (EMA). Na Hungria, a vacina já está sendo inclusive administrada.
Antes da Sputnik V, a Anvisa já havia negado o pedido de importação excepcional feito pelo Ministério da Saúde para a Covaxin, da empresa indiana Bharat Biotech, apontando falta de dados.
Os imunizantes contra a covid-19 que já receberam luz verde da agência para uso emergencial ou registro são: a Coronavac, desenvolvida pela Sinovac em parceira com o Instituto Butantan; a Covishield, desenvolvida pela Universidade de Oxford em parceria com o laboratório AstraZeneca; a vacina da Pfizer-Biontech; e o imunizante da Johnson & Johnson, desenvolvido por seu braço farmacêutico Janssen.
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lf (AFP, ABR, DW, OTS)
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