Uma família da etnia Yanomami na Amazônia brasileiraCom a expansão da pandemia de coronavírus no Brasil, os povos originários somam seus mortos à lista de vítimas da covid-19 que cresce a cada dia. Já foram registrados 77 óbitos entre povos de 34 etnias indígenas do país —com 308 casos de infecções confirmadas—, de acordo com os números da Sesai (Secretaria Especial de Saúde Indígena) e da APIB (Articulação dos Povos Indígenas do Brasil). Cerca de 81 mil indígenas de 230 territórios estão ameaçados pelo novo coronavírus, de acordo com esses órgãos. “É assustadora a velocidade com que registramos o aumento de casos de mortes entre os povos indígenas. Em pouco mais de uma semana, identificamos mais 49 óbitos de parentes, chegando à média de quatro mortes de indígenas por dia”, lê-se em nota da APIB.
A etnia mais afetada é a dos Kokama, no Amazonas. Entre os dias 3 e 7 de maio, as mortes por covid-19 dobraram entre essa comunidade, passando de nove para 22 óbitos registrados, de acordo com um relatório da APIB. A etnia também foi a que teve o primeiro caso registrado da doença entre indígenas no Brasil, no dia 25 de março. Já a primeira morte de indígena em decorrência do novo coronavírus contabilizada oficialmente foi a de uma adolescente Yanomami de 15 anos, em Roraima, no dia 10 de abril.
“A covid-19 já matou, só nos últimos dias, 12 parentes kokamas, parentes esses que moram em comunidades. Como não dizer que foi omissão? Nós líderes estamos fazendo a nossa parte, esperamos que nossos governantes façam as partes deles”, denuncia em nota a Associação de Índios Kokamas Residentes no Município de Manaus (AKIM).
De acordo com dados da Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab), no Amazonas os casos de mortes entre o povo Kokama aconteceram nos municípios de Tabatinga, Benjamin Constant, Santo Antônio do Içá, Itacoatiara, Autazes e Manaus. O Estado, um dos mais afetados pela pandemia —soma 14.168 casos do novo coronavírus e 1.098 óbitos, segundo o Ministério da Saúde— já registrou a morte por covid-19 de 43 indígenas de nove povos diferentes.
Outras ameaças
Em meio ao avanço da pandemia entre os povos originários, o Congresso colocou em votação nesta terça-feira a Medida Provisória (MP) 910, que, na prática, regulariza terras ocupadas irregularmente no país. A MP beneficia casos recentes de grilagem, anistiando o crime de invasão de terra pública (e favorecendo sua titulação) àqueles que o praticaram entre o final de 2011 e 2018, além de estimular novas ocupações e desmatamentos ilegais ao reforçar a expectativa de grileiros e posseiros ilegais na Amazônia de que os prazos serão, novamente, no futuro, atualizados pelo governo federal ou Congresso Nacional. Lideranças de partidos como o MDB e o PSL sugeriram que o Congresso deixe deixe de discutir a regularização fundiária por meio da MP e que e trate do tema por meio de um projeto de lei, a ser analisado na semana que vem.
Diversas organizações socioambientais, tais como o CIMI (Conselho Indigenista Missionário), ISA (Instituto Socioambiental), Greenpeace e WWF-Brasil, além de ex-Ministros do Meio Ambiente, como Sarney Filho, Carlos Minc e Marina Silva, se pronunciaram contrariamente à MP 910. A APIB argumenta que, se aprovada, a medida pode colaborar para o aumento dos casos de morte e contaminação dentro dos territórios indígenas, “pois incentiva o aumento das invasões que viola o isolamento social das comunidades”.
A APIB realizou, nos dias 8 e 9 de maio, a Assembleia Nacional de Resistência Indígena para traçar um plano de enfrentamento da pandemia específico ao contexto dos povos indígenas. “Em tempos de pandemia, a luta e a solidariedade coletiva que reacendeu no mundo só será completa com os povos indígenas, pois a cura estará não apenas no princípio ativo, mas no ativar de nossos princípios humanos”, conclui a nota da associação.
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El País
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