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Economia

Governo esconde bloqueio de R$ 3,5 bi em emendas para evitar desgaste às vésperas da eleição

Com nova trava nas verbas parlamentares, cúpula do Congresso fica sem dinheiro para aliados

O presidente Jair Bolsonaro e o presidente da Câmara, Arthur Lira, em cerimônia em BrasíliaO governo Jair Bolsonaro (PL) decidiu impor um bloqueio mais severo do que o inicialmente sinalizado sobre as emendas de relator, usadas como moeda de troca nas negociações com o Congresso Nacional, para proporcionar alívio aos ministérios com despesas comprimidas.

O esforço necessário para conter despesas era de R$ 2,6 bilhões, conforme anunciado em 22 de setembro pelo Ministério da Economia (que não detalhou as pastas ou os valores em emendas que seriam alvos do congelamento). Mas a decisão foi bloquear um valor ainda maior, de R$ 3,5 bilhões em emendas, para remanejar a diferença de quase R$ 1 bilhão a órgãos que enfrentavam maiores dificuldades.

Em meio à campanha eleitoral, o Ministério da Economia vem escondendo os números oficiais do ajuste no Orçamento de 2022. A Folha apurou os dados com diferentes integrantes do governo e do Congresso.

De acordo com os relatos, o governo destravou cerca de R$ 600 milhões para a Economia, que havia sofrido cortes severos no início do ano, e R$ 250 milhões para o Ministério do Trabalho e Previdência —boa parte da verba foi para manter agências do INSS e a central telefônica do órgão (135) funcionando, além de pagar os contratos com a Dataprev, que processa a folha de pagamento dos benefícios.

Os ministérios da Defesa e da Ciência, Tecnologia e Inovações, além da Presidência da República, também receberam recursos no último dia 30 de setembro, quando foi publicado o decreto de programação orçamentária.

O bloqueio nas emendas irritou o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), que havia acertado a destinação de parte dessas verbas com parlamentares aliados. Outra parcela ainda seria negociada até o fim do ano, em meio à tentativa de Lira de garantir sua recondução ao comando da Casa na votação prevista para fevereiro de 2023.

A trava nos recursos atrapalha os planos do deputado, que ficou praticamente sem dinheiro para agradar aliados. Dos R$ 16,5 bilhões previstos em emendas de relator para este ano, R$ 8,7 bilhões já foram empenhados (primeira fase do gasto, quando é firmado o compromisso com a contratação de bens ou serviços) e outros R$ 7,7 bilhões estão bloqueados.

Nos bastidores do Congresso, fala-se que a verba efetivamente disponível no momento é de cerca de R$ 15 milhões apenas. Por isso, Lira intensificou a pressão sobre o Ministério da Economia nos últimos dias, mas ainda não recebeu sinalização positiva de que será atendido.

Líderes governistas relatam, reservadamente, que também estão sendo cobrados para obter do Palácio do Planalto uma solução para o impasse. Há emendas que foram prometidas e negociadas antes das eleições e não avançaram nos ministérios.

A expectativa de aliados do Planalto é que o governo ceda à pressão antes do segundo turno e libere a verba. A avaliação de técnicos, no entanto, é que o Orçamento está bastante apertado, e um espaço para desbloquear emendas ainda é incerto.

O tema é considerado delicado dentro do governo, uma vez que Lira é aliado próximo de Bolsonaro. Além disso, há a avaliação de que, em meio ao acirramento da campanha eleitoral, qualquer anúncio pode gerar ruídos.

Em 31 de agosto, o Ministério da Economia enviou ao Congresso uma proposta de Orçamento para 2023 com cortes espalhados por diversas ações sociais e políticas que beneficiam mulheres —que são 53% do eleitorado e rejeitam, em sua maioria, a reeleição de Bolsonaro.

As notícias sobre os cortes previstos para o ano que vem tiveram péssima repercussão e foram amplamente usadas como munição pelo campo adversário para desgastar a imagem do presidente. As tesouradas foram temas de programas eleitorais na TV e também surgiram em debates presidenciais.

A experiência passada deixou o governo mais avesso a dar ampla publicidade ao novo bloqueio no Orçamento deste ano.

A ala política também se frustrou porque havia a expectativa de que a revisão periódica do Orçamento em setembro permitiria uma liberação de recursos, o que não se concretizou.

Em meio à pressão dos parlamentares, Bolsonaro chegou a implementar uma manobra para adiar e limitar gastos com as áreas de cultura, eventos e ciência e tecnologia, abrindo espaço no Orçamento. Em seguida, ele editou um decreto para antecipar a liberação dos recursos. Na véspera do 7 de Setembro, o governo destravou R$ 3,5 bilhões em emendas de relator para o Congresso.

Cerca de duas semanas depois, no entanto, a Economia detectou uma surpresa nas despesas com Previdência e precisou rever a medida. A pasta segurou R$ 2,6 bilhões para evitar um estouro no teto de gastos, regra que limita o avanço das despesas à variação da inflação.

Em entrevista coletiva em 22 de setembro, os técnicos da Economia evitaram dizer se as emendas seriam o alvo preferencial do novo bloqueio, mas deram pistas de que elas seriam fortes candidatas. Naquele dia, dos R$ 3,5 bilhões liberados para os parlamentares, apenas R$ 6 milhões haviam sido executados.

Os parlamentares e os ministérios até começaram uma corrida para empenhar as verbas, mas não conseguiram fugir do bloqueio diante da demora no processo de execução das despesas.

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Da Folha de São Paulo