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Nova Lei de Improbidade Administrativa: 10 pontos que você precisa conhecer

Foi publicada no último dia 26 a Lei nº 14.230, que promoveu profundas alterações no procedimento e nas regras a serem aplicadas nos inquéritos e ações civis relacionados a atos de improbidade administrativa. As alterações foram no sentido de conferir maior segurança jurídica ao gestor público e de diminuir os espaços de subjetividade das autoridades encarregadas da aplicação da lei, em especial o Poder Judiciário e o Ministério Público. Vejamos a seguir dez pontos que ilustram o espírito da alteração legislativa:

1) Necessidade de comprovação de dolo específico de lesar a Administração Pública para configuração de ato de improbidade

Com a publicação da nova lei passa a ser exigida a comprovação de dolo específico do agente em praticar os atos de improbidade descritos nos artigos 9º, 10 e 11, não bastando a simples comprovação de dolo genérico. Nesse sentido estão os §§2º e 3º do artigo 1º, que preveem, respectivamente, uma definição estreita de dolo ("vontade livre e consciente de alcançar o resultado ilícito", "não bastando a voluntariedade do agente") e a vedação ao sancionamento de atos de gestão da coisa pública sem demonstração de ato doloso com fim ilícito. A alteração, dessa forma, revoga o entendimento do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que, para caracterização de determinados atos de improbidade, como aqueles previstos no artigo 11, bastaria o dolo genérico [1].

Além disso, a nova lei proíbe o sancionamento de atos culposos, como prevê o artigo §1º do artigo 17-C ao dispor que a ilegalidade, sem presença de dolo, não configura ato de improbidade. Com isso, afasta-se a possibilidade de aplicação de sanção ao gestor que atuar sem a intenção de lesar o patrimônio público, o que evidentemente restringirá — e muito — o alcance da lei.

2) Divergências interpretativas não configuram ato de improbidade

A lei passa a prever de forma expressa no §8º do artigo 1º que "não configura ato de improbidade a ação ou omissão decorrente de divergência interpretativa da lei, baseada em jurisprudência, ainda que não pacificada, mesmo que não venha a ser posteriormente prevalecente nas decisões dos órgãos de controle ou dos tribunais do Poder Judiciário". Trata-se de mais um mecanismo que busca evitar o denominado "apagão das canetas": cenário em que o gestor público, receoso dos riscos jurídicos da tomada de uma decisão, deixa de praticar o ato administrativo, ainda que amparado em parecer legal e movido somente pelo interesse público.

3) Delimitação do conceito de agente público por extensão e necessidade de comprovação de dolo também do agente por extensão

A antiga Lei de Improbidade (Lei nº 8.429/92) previa em seu artigo 2º que era considerado "agente público o agente político, o servidor público e todo aquele que exercesse, ainda que transitoriamente ou sem remuneração, por eleição, nomeação, designação, contratação ou qualquer outra forma de investidura ou vínculo, mandato, cargo, emprego ou função nas entidades referidas no artigo 1º daquela lei". Esse conceito permanece inalterado com a nova lei.

No entanto, foi dada nova redação ao artigo 3º para constar expressamente que as disposições da Lei de Improbidade são aplicáveis, no que couber, "àquele que, mesmo não sendo agente público, induza ou concorra dolosamente para a prática do ato de improbidade". Mais uma vez, a lei se preocupou em deixar expressa a necessidade de comprovação de dolo também para fins de equiparação de agente público.

4) Sócios, cotistas, diretores e colaboradores da pessoa jurídica só respondem por ato de improbidade se ficar comprovada participação na realização do ato e que houve algum tipo de benefício direto

De acordo com o artigo 3º, §1º, "os sócios, os cotistas, os diretores e os colaboradores de pessoa jurídica de direito privado não respondem pelo ato de improbidade que venha a ser imputado à pessoa jurídica, salvo se, comprovadamente, houver participação e benefícios diretos, caso em que responderão nos limites da sua participação". A alteração busca sedimentar a vedação à responsabilidade objetiva — aquela que decorre não da prática de ações ou omissões concretas, mas da simples ocupação de um cargo ou função.

5) Ampliação da responsabilidade sucessória

Previa o artigo 8º da antiga lei que "o sucessor ou o herdeiro daquele que causar dano ao erário ou que se enriquecer ilicitamente estão sujeitos apenas à obrigação de repará-lo até o limite do valor da herança ou do patrimônio transferido". A redação desse dispositivo permanece inalterada.

No entanto, foi incluído o artigo 8º-A, para ampliar a responsabilidade sucessória também na hipótese de "alteração contratual, de transformação, de incorporação, de fusão ou de cisão societária". Nestes casos, "a responsabilidade da sucessora será restrita à obrigação de reparação integral do dano causado, até o limite do patrimônio transferido, não lhe sendo aplicáveis as demais sanções previstas na lei decorrentes de atos e de fatos ocorridos antes da data da fusão ou da incorporação, exceto no caso de simulação ou de evidente intuito de fraude, devidamente comprovados".

6) Dosimetria da pena

A lei passa a contar com um capítulo específico para a dosimetria da pena, suprindo uma importante lacuna da antiga Lei de Improbidade. Nesse sentido, foi incluído o artigo 17-C, inciso IV, que passa a prever a necessidade de o juízo considerar, na fixação da sanção, os seguintes aspectos: 1) os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade; 2) natureza, gravidade e impacto da infração; 3) extensão do dano causado; 4) proveito patrimonial obtido pelo agente; 5) circunstâncias atenuantes e agravantes; 6) a atuação do agente em minorar os prejuízos e as consequências advindas de sua conduta omissiva ou comissiva; e 7) os antecedentes do agente, o que deverá promover maior transparência e possibilidade de controle dos critérios judiciais determinantes para fixação do quantum da sanção.

7) Non bis in idem e o abrandamento do princípio da independência das instâncias

Os atos de improbidade administrativa podem gerar reflexos nas esferas penal, civil e administrativa. Nesse sentido, a nova lei se preocupou com o fenômeno da multiplicidade das instâncias, prevendo que as sanções da lei de improbidade não podem ser cumuladas com sanções da Lei Anticorrupção (Lei 12.843/13), trazendo expressamente a menção ao princípio non bis in idem, de forma inédita na legislação extrapenal (artigo 12, §7º).

Além disso, a nova lei fixou que, em caso de absolvição pelos mesmos fatos na esfera penal, deve ser extinta a ação de improbidade (artigo 21, §4º). Interessante notar que a nova disposição foi além do que dispõem os artigos 935 do Código Civil de 2002 [2] e 126 da Lei nº 8.112/90[3] e artigos 66 e 67, III, do Código de Processo Penal[4], que preveem a comunicação de efeitos entre as esferas penal e civil apenas em caso de absolvição por demonstração de inexistência do fato ou da autoria. Agora, mesmo a absolvição na esfera penal por insuficiência de provas deve levar à extinção da ação civil de improbidade administrativa, o que deverá conduzir a uma revisão do posicionamento do STJ a respeito do alcance do princípio da independência das instâncias [5].

8) A morte do in dubio pro societate

O STJ havia firmado o entendimento de que "após o oferecimento de defesa prévia prevista no § 7º do artigo 17 da Lei 8.429/1992 — que ocorre antes do recebimento da petição inicial —, somente é possível a pronta rejeição da pretensão deduzida na ação de improbidade administrativa se houver prova hábil a evidenciar, de plano, a inexistência de ato de improbidade, a improcedência da ação ou a inadequação da via eleita. Isso porque, nesse momento processual das ações de improbidade administrativa, prevalece o princípio in dubio pro societate" [6]..

Contudo, a nova Lei de Improbidade passou a prever critérios mais rígidos para o recebimento da petição inicial. Assim, o artigo 17, §6º, prevê como requisitos: 1) a individualização da conduta do réu, com a demonstração de elementos probatórios da materialidade e autoria da infração; e 2) juntada de documentos comprobatórios que contenham indícios suficientes da veracidade dos fatos e do dolo imputado ou com razões fundamentadas da impossibilidade de apresentação dessa prova. A alteração, portanto, fixou critérios objetivos para aferição da viabilidade inicial do prosseguimento da ação, demandando maior esforço investigativo e probatório por parte do Ministério Público e o afastamento da ideia traduzida pelo in dubio pro societate. Note-se que o brocardo, na esfera penal, já vinha sofrendo críticas na jurisprudência do STF, por ausência de previsão constitucional para o princípio [7].

9) Indisponibilidade cautelar de ativos

O STJ também havia fixado o entendimento de que: "É possível a inclusão do valor de eventual multa civil na medida de indisponibilidade de bens decretada na ação de improbidade administrativa, inclusive naquelas demandas ajuizadas com esteio na alegada prática de conduta prevista no artigo 11 da Lei 8.429/1992, tipificador da ofensa aos princípios nucleares administrativos" (Tema 1055).

No entanto, a Lei 14.230/2021 afastou a possibilidade de indisponibilidade de valor correspondente à multa civil, limitando a constrição apenas ao valor do dano ao erário: "A indisponibilidade recairá sobre bens que assegurem exclusivamente o integral ressarcimento do dano ao erário, sem incidir sobre os valores a serem eventualmente aplicados a título de multa civil ou sobre acréscimo patrimonial decorrente de atividade lícita" (artigo 16, §10º). O dispositivo deverá promover uma reanálise de inúmeros pedidos de bloqueio cautelar atualmente vigentes nas ações de improbidade administrativa em curso, pois sendo lei de natureza processual, seus efeitos aplicam-se de imediato.

10) Fortalecimento do princípio da correlação entre sentença e acusação

Por fim, outra importante alteração está prevista no artigo 17, §10-C e 10-F [8], que, de forma expressa, determina a necessidade de que exista correspondência entre o objeto da ação e o objeto da sentença, ou seja: deve existir congruência da condenação com a imputação. É o que estabelece o princípio da correlação entre sentença e acusação e que agora passa a constar de forma expressa na nova lei, sendo nula a decisão judicial que fuja à tipificação dada na inicial (artigo 17, §10-F, I).

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Consultor Jurídico