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Quilombolas que tiveram casas destruídas em Barcarena devem retomar território, diz MP

Na Justiça, MPF diz que famílias têm direito a indenização por danos morais e materiais e retorno imediato a suas terras

Comunidades quilombolas de Barcarena (PA) estão há mais de uma década travando uma série de batalhas para poderem continuar existindo"Esse episódio a que a gente assistiu é algo cotidiano na vida das comunidades tradicionais do município de Barcarena (PA) desde a implantação do complexo industrial". A declaração é do procurador do Ministério Público Federal (MPF) Felipe de Moura Palha, que assinou manifestação enviada à Justiça de Barcarena, responsável pela ordem de despejo dos quilombolas do Sítio Conceição.

O documento pede a imediata revogação do despejo e envio do processo para a Justiça Federal, uma vez que o território em litígio se trata de uma área quilombola reconhecida e em processo de titulação pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra).

Em entrevista do Brasil de Fato, o procurador Felipe de Moura Palha disse que as comunidades quilombolas do município estão há mais de uma década travando uma série de batalhas para poderem continuar existindo, uma vez que o território foi invadido, segundo ele, pela Companhia de Desenvolvimento de Barcarena (Codebar), uma estatal federal com participação acionária do estado do Pará e do município de Barcarena, criada em 1979, pelo então presidente da República, general João Figueiredo, e extinta em 2007, quando seus ativos passaram ao controle da União.

O procurador pontua ainda que os quilombolas já foram removidos outras vezes de suas áreas e que as pessoas não só têm direito ao território novamente como também têm direito a uma indenização pelo que passaram.

"Os patriarcas [dos quilombolas que residem hoje no território] foram vítimas de deslocamento forçado [pela Codebar], com indenizações irrisórias. As pessoas foram expulsas das suas áreas e tiveram que morar na periferia de Barcarena, no bairro do Laranjal, formado a partir dessas expulsões das comunidades dos seus territórios", explica.

No ano de 2007, a Codebar foi liquidada e os ativos dela passados para a União. Assim, a gestão das áreas em disputa até os dias de hoje é da Secretaria do Patrimônio da União (SPU), que, segundo o procurador, mantém hoje não só a violenta política de remoção das populações tradicionais como também o não reconhecimento das comunidades quilombolas que existem na cidade. 

Afirma o MPF: além do Sítio Conceição, alvo atual da situação, outras quatro comunidades quilombolas de Barcarena são constantemente vítimas de ações ilegais por parte do Estado: Gibrié de São Lourenço; Ramal Cupuaçu; Sítio São João e Burajuba. 

O procurador diz ainda que há repetidas ações do MPF contra a União, devido a sucessivas violações de direitos dessas comunidades, entre elas um leilão de terras quilombolas que o Executivo brasileiro tentou promover, mas que foi impedido pela Justiça graças a peticionamentos do Ministério Público Federal. Disse ao Brasil de Fato o procurador:

"Posso dizer isso, sim, sem medo: o maior violador de direitos territoriais de comunidades tradicionais de Barcarena é o próprio poder público, que não reconhece a existência dessas comunidades"

E concluiu: "o Estado criminaliza a tradicionalidade daquela daquelas comunidades". 

Legalizando o ilegal 

Na ação de despejo realizada nesta quarta-feira (14), as terras quilombolas eram registradas como propriedade da União, que por sua vez as doou ao município de Barcarena. Conforme explica o representante do MPF, porém, trata-se de negócio impossível sob o manto da lei, de fato uma ação ilegal: 

"A União doou uma grande quantidade de terras que eram da antiga Codebar para o município de Barcarena e o município de Barcarena fez o registro dessas áreas no cartório. É por isso que saiu a ordem judicial, porque o município tem o registro de uma área que a União doou para o município, mas eles omitem fatos imprescindíveis para o entendimento da situação: omitem que têm comunidades tradicionais vivendo no local no local.". 

Dessa forma, o procurador explica que processo judicial – que deu amparo para a ação de despejo – foi preparado para parecer que, quando a Codebar se deu conta de que as terras de sua propriedade cartorária eram ocupadas por famílias que ai viviam e plantavam, alegou deparar-se com "uma invasão" de seu patrimônio.

A estatal foi à Justiça pedir reintegração de posse, pedido acatado pela 1ª Vara Federal Cível e Empresarial da Comarca de Barcarena (PA), como se o local fosse um imóvel privado e não uma comunidade quilombola que tem um processo de titulação coletivo, que não apenas não se tratam de invasores de terras desde pouco instalados ali, mas sim de uma comunidade tradicional já inserida em processos de reconhecimento.

O Brasil de Fato entrou em contato com a prefeitura de Barcarena pedindo esclarecimentos sobre o pedido do MPF, mas eles disseram que não irão se manifestar.

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Catarina Barbosa / Brasil de Fato