O Brasil celebra os Jogos Olímpicos de Tóquio com o melhor desempenho em número de pódios de sua história, justamente quando o país mais deixou de lado o esporte e mantém sem reajuste, desde 2010, o principal auxílio dos competidores, o Bolsa Atleta. Neste sábado, o Brasil celebra 19 medalhas conquistadas no Japão, sendo 7 de ouro, 4 de prata e 8 de bronze, igualando as 19 ganhas no Rio de Janeiro em 2016. Há, ainda, mais duas medalhas garantidas: nas finais do vôlei feminino, com o time do técnico José Roberto Guimarães, e no boxe feminino, com a baiana Beatriz Ferreira. O país está, neste momento, em 12º lugar no ranking dos Jogos de Tóquio e, com sorte, pode terminar neste domingo com a melhor posição da história (o recorde é o 13º lugar).
O resultado tem sido comemorado pelo presidente Jair Bolsonaro, enaltecido em perfis oficiais de comunicação do Planalto e por vários ministros. No entanto, os cortes de verba do esporte e o sucateamento do Bolsa Atleta nos últimos anos mostram que os brasileiros tiveram um desempenho histórico em Tóquio apesar do Governo, e não por causa dele. Bolsonaro, na verdade, extinguiu o Ministério do Esporte assim que assumiu, transformado-o em secretaria subordinada ao Ministério da Cidadania, e reduziu ao mínimo o número de servidores atuando no setor.
Criado em 2005, o Bolsa Atleta vive seu pior momento financeiro. A começar pelo fato de que não tem o valor reajustado desde 2010. O benefício é dividido em quatro categorias principais: Bolsa Pódio, para quem consegue ficar entre os 20 primeiros no ranking mundial de sua categoria; Olímpica, para quem representou o Brasil em Jogos Olímpicos ou Paralímpicos; Bolsa Internacional, para quem representou o Brasil em campeonatos internacionais e ficou entre os três primeiros; e Bolsa Nacional, para quem participa do evento máximo da temporada nacional. A primeira categoria paga de 5.000 a 15.000 reais mensais. A segunda, 3.100 reais; a terceira, 1.850 reais; e a quarta, 925 reais.
Segundo levantamento do ge.globo.com, dos 301 atletas que foram a Tóquio, 242 recebem a Bolsa e 83 ganham as duas menores categorias, que correspondem a menos de 2.000 reais por mês. Além disso, 33 dos 301 se sustentam graças a outra profissão. São cinco motoristas de aplicativo, quatro empresários e quatro profissionais de educação física, as três profissões mais comuns aos atletas que não conseguem ser só atletas. Felipe Vinícius dos Santos, que competiu na prova de decatlo (terminou em 18°), é um dos que precisou dirigir Uber para se sustentar na preparação.
Além disso, o Governo não lançou o edital do Bolsa Atleta em 2020 e deixou os atletas sem receber por alguns meses. Antes, os esportistas se inscreviam no edital lançado em maio e, se aprovados, começavam a receber o auxílio em agosto. O prazo entre a abertura de inscrições e o pagamento da primeira parcela é usualmente de três meses. Então, as 12 parcelas eram repassadas mensalmente de agosto até julho do ano seguinte. Elas terminavam um mês antes de começar o pagamento do próximo acordo anual, em caso de renovação no edital seguinte. Desta forma, era garantida a renda do atleta durante todos os meses do ano, desde que seu auxílio seja aprovado ano a ano.
A partir do Governo Temer, em 2017, o mês de lançamento do edital passou a ser atrasado de tal forma a provocar “buracos” entre o último mês do pagamento anterior e o início do próximo. Por exemplo: até 2016, o atleta se inscrevia no edital em maio, começava a receber o auxílio em agosto de 2016 e tinha o 12º e último pagamento em julho de 2017. No entanto, a abertura do edital de 2017 foi atrasada para agosto, o que fez a primeira parcela cair somente três meses depois, em novembro de 2017. Com a Bolsa renovada, o atleta voltou a receber de novembro de 2017 a outubro de 2018, mas ficou sem pagamento nos meses de agosto, setembro e outubro de 2017. E a prática foi repetida ano a ano.
_________
EL PAÍS
16/10/2024 | 12:05
10/10/2024 | 06:08
29/09/2024 | 13:11