O presidente Jair Bolsonaro na parte externa do Palácio da AlvoradaTranscrições de grampos telefônicos sugerem que o presidente Jair Bolsonaro foi contactado por aliados de Adriano da Nóbrega, ex-capitão do Bope (Batalhão de Operações Policiais Especiais).
Os diálogos transcritos constam em um relatório da Subsecretaria de Inteligência da Secretaria de Polícia Civil do Rio, ao qual o The Intercept teve acesso. A investigação quebrou os sigilos telefônico e telemático de suspeitos de ajudar o miliciano no tempo em que ele ficou foragido –pouco mais de 1 ano.
Adriano da Nóbrega é apontado pelo MP-RJ (Ministério Público do Rio de Janeiro) como chefe da milícia de Rio das Pedras, na zona oeste da capital fluminense, e do chamado “Escritório do Crime”.
Morto em fevereiro de 2020, o ex-policial é suspeito da morte da vereadora Marielle Franco (Psol) e do motorista Anderson Gomes.
Pouco depois da morte de Adriano, comparsas do miliciano citam nas conversas “Jair” e “cara da casa de vidro”. Eles ainda conversam com um homem identificado no relatório como “HNI (PRESIDENTE)”.
A reportagem do The Intercept falou com fontes do MP-RJ, sob a condição de anonimato. Segundo elas, é possível concluir que os nomes são formas de se referir ao presidente. “Casa de vidro” seria uma alusão aos palácios do Planalto e da Alvorada, que possuem as fachadas feitas de vidro.
Procurado pelo Poder360, o Planalto disse que não vai se manifestar. O Ministério Público Estadual afirmou ao jornal digital que questões relativas ao relatório devem ser tratadas com a Polícia Civil, que não respondeu aos questionamentos. O espaço segue aberto para manifestações.
O Ministério Público Estadual pediu que a Justiça encerrasse as escutas logo depois das citações, reforçando a tese de que se trata de Jair Bolsonaro. O órgão não tem competência para investigar o presidente da República –cabe à PGR (Procuradoria Geral da República) a análise desses casos.
Procurada pelo The Intercept, a PGR afirmou que a pesquisa nos sistemas da Procuradoria por meio do número de processo indicado não retornaram resultados. Fonte do órgão declarou que o processo pode ter sido encaminhado com um número diferente, que ele pode ainda não ter sido encaminhado ou que a PGR apenas não o encontrou nos arquivos.
As conversas com supostas referências a Bolsonaro começaram em 9 de fevereiro de 2020, dia da morte do miliciano, e seguiram por 11 dias.
A 1ª ligação foi feita horas depois da morte de Adriano por Ronaldo Cesar, conhecido como Grande. Ele é apontado como um dos elos entre os negócios legais e ilegais do miliciano. No telefonema, ele afirmou a uma mulher não identificada que ligaria para o “cara da casa de vidro” e disse que havia conversado com Adriano de que algo “ruim” iria acontecer.
Ele comentou ainda sobre pendências financeiras, disse que queria saber “como vai ser o mês que vem” e que a “parte do cara tem que ir”.
Em outro diálogo, de 13 de fevereiro de 2020, Grande conversou com um homem. Na transcrição, essa pessoa é definida como HNI (sigla para “homem não identificado”) e, entre parênteses, PRESIDENTE, em letras maiúsculas.
Grande relatou que a família de Adriano enfrentava problemas de divisão de bens. O interlocutor se colocou à disposição para ajudar em algum contratempo futuro.
Em conversas do pecuarista Leandro Abreu Guimarães e de sua mulher, Ana Gabriela Nunes, também em 13 de fevereiro de 2020, o nome “Jair” é mencionado.
Ana Gabriela, por exemplo, conversou com uma mulher identificada como Nina. Ela disse que a polícia voltou a sua casa “com o promotor” e que o “Leandro está querendo falar com Jair”.
Investigações apontam que o casal escondeu Adriano da Nóbrega numa fazenda da família depois que fugiu de um cerco policial em 31 de janeiro de 2020.
O The Intercept revelou, em março, que o nome do presidente Jair Bolsonaro já havia sido citado por pessoas ligadas a Adriano.
O sargento da PM Luiz Carlos Felipe Martins, conhecido como Orelha, disse a um interlocutor não identificado que “Adriano falava que se fodia por ser amigo do presidente da República”. Orelha era um dos homens de confiança do miliciano
Adriano tinha ligação ainda com o senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ), filho do presidente.
Em 2005, quando Flavio ocupava o cargo de deputado estadual, ele homenageou o ex-capitão do Bope “pelos inúmeros serviços prestados à sociedade” na Alerj (Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro).
A mãe e a ex-mulher de Adriano, Raimunda Veras Magalhães e Danielle Mendonça da Costa, respectivamente, apareciam como funcionárias do gabinete de Flavio quando ele ainda era deputado estadual, em 2018.
Adriano era amigo do ex-PM Fabrício Queiroz –ex-assessor do hoje senador Flavio Bolsonaro. Queiroz é suspeito de ter recebido repasses de duas pizzarias controladas por Adriano. O montante seria de R$ 72.500. A suspeita do Ministério Público é de que o ex-capitão do Bope atue como sócio oculto das empresas.
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Poder 360
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