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Poder

Moro deixa o governo atirando: Bolsonaro quer interferir politicamente na PF

O agora ex-ministro afirmou à imprensa que presidente violou promessa de carta branca no cargo e que queria alguém no comando a quem pudesse “ligar, colher informações e relatório de inteligência”

Jair Bolsonaro ao lado de Sergio Moro, em dezembro do ano passadoEm um discurso duro, em que acusou o presidente Jair Bolsonaro de interferir politicamente no trabalho da Polícia Federal, o ex-juiz da Lava Jato, Sergio Moro, deixou o Governo nesta sexta-feira. A saída dele do Ministério da Justiça e Segurança Pública aconteceu após a exoneração do diretor-geral da Polícia Federal, Maurício Valeixo, oficializada na manhã desta sexta-feira. Moro afirmou que Bolsonaro, desde o ano passado, pede a troca do comando por alguém a quem “pudesse ligar para colher informações" sobre investigações. “O problema não é a troca, mas é permitir que seja feita a interferência política no âmbito da Polícia Federal”. Afirmou ainda que Bolsonaro o informou que tinha “preocupações com investigações” feitas pelo órgão. “Eu não tinha como aceitar essa substituição”, concluiu ele.

“O presidente queria alguém que ele pudesse ligar, colher informações, relatório de inteligência. Seja o diretor, seja o superintendente. E, realmente, não é o papel da Polícia Federal se prestar a esse tipo de função”, afirmou Moro em fala à imprensa nesta manhã. “Percebendo que essa interferência política pode levar a relações impróprias do diretor-geral, de superintendentes com o presidente da República, é algo que eu não posso concordar”.

A notícia da saída do diretor-geral começou a circular na tarde de quinta-feira e gerou uma crise nos bastidores do Planalto. Valeixo trabalhou com o ex-juiz no início da Operação Lava Jato e foi levado por ele ao comando da PF no início da gestão Bolsonaro, por isso era homem de confiança de Moro. Militares entraram em ação durante a tarde para tentar evitar a saída do superministro da pasta da Justiça. Acenaram com a possibilidade de ele ser responsável pela indicação do substituto. Nesta sexta-feira, o Diário Oficial trouxe a exoneração do diretor-geral da PF. Em seguida, o ministério informou a imprensa que Moro faria uma coletiva às 11h, sem adiantar o tema.

Nos bastidores em Brasília, a saída às pressas de Valeixo é creditada a abertura de inquérito para investigar a organização das manifestações favoráveis à ditadura militar ocorridas no último domingo, dia 19, e endossadas pelo presidente. O pedido de investigação, feito pelo procurador-geral da República, Augusto Aras, foi aceito pelo ministro do Supremo Tribunal Federal, Alexandre de Moraes. A investigação ficará a cargo da Polícia Federal. Apesar de o inquérito não ter, inicialmente, Bolsonaro como alvo, há o temor do Governo de que no decorrer da investigação ele acabe envolvido. E que se chegue a nomes de organizadores próximos a ele.

Além disso, é de responsabilidade da Polícia Federal também as investigações referentes ao inquérito da fake news do STF, que apura a disseminação de notícias falsas em redes sociais e que podem envolver Carlos e Eduardo, filhos do presidente. Também há a preocupação de que a Polícia Federal avance nas investigações contra o terceiro filho de Bolsonaro, o senador Flávio (Republicanos-RJ), suspeito de desviar recursos de seus antigos assessores na Assembleia Legislativa do Rio.

Moro chegou ao ministério no ano passado com a alcunha de superministro e com a promessa de que teria carta branca para atuar. Mas não foi isso que ocorreu na prática. Meses depois da posse, Bolsonaro passou a dizer que ele próprio tinha poder de veto sob as decisões ministeriais. Esta foi a quinta vez que o presidente deu sinais públicos para enfraquecer Moro, um ministro mais popular que o próprio mandatário. As outras foram: quando Bolsonaro aventou a possibilidade de demitir Valeixo no ano passado, sinalizando que trocaria o superintendente da PF no Rio de Janeiro, quando sugeriu que dividiria o ministério em dois; e quando sancionou a lei que criava a figura do juiz de garantias, contrariando a orientação de Moro. Além de ser constantemente alvo de fogo amigo provindo do Palácio do Planalto, Moro se incomodou com a aproximação de Bolsonaro com figuras condenadas ou rés nos dois maiores escândalos de corrupção do país, o mensalão do PT a Lava Jato.

A saída ocorre pouco mais de uma semana depois de o ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, deixar o posto em seu momento de maior popularidade, em meio ao combate à crise da Covid-19.

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El País