Pandemia de covid-19 limitou campanha eleitoral neste anoSe em 2018 o processo eleitoral brasileiro já ocorreu prioritariamente no meio digital, este ano o fenômeno deve ser ainda mais intenso: não só pela consolidação das redes sociais como fonte fundamental de informação popular, mas também pelo cenário da pandemia de covid-19, que acabou limitando eventos de campanha.
De olho nesse contexto, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) decidiu criar a inédita Coordenaria Digital de Combate à Desinformação. Em agosto, o ministro Luís Roberto Barroso convidou o programador Thiago Rondon para assumir o comando do órgão, que atuará por três meses.
Aos 37 anos, Rondon já acumula uma farta experiência em "tecnologia cívica", como ele mesmo chama essa atuação. O programador desenvolveu, entre outros, as plataformas Para Onde Foi Meu Dinheiro – que possibilitava monitorar os gastos públicos – e Voto Legal – de financiamento coletivo de campanhas eleitorais. Atualmente, ele está à frente do Instituto Tecnologia e Equidade e da empresa AppCívico.
Em entrevista à DW Brasil, Rondon fala sobre os esforços do TSE para conter a desinformação e a propagação de notícias falsas no período eleitoral.
DW Brasil: A pandemia trouxe de vez a campanha política para o mundo digital. Quais são as principais preocupações para conter a desinformação eleitoral?
Thiago Rondon: A crise sanitária e econômica e os processos de desinformação acelerados pelo uso da tecnologia são um desafio conjunto. Nossa maior preocupação é que os eleitores fiquem sem acesso à informação verdadeira. Nesse sentido, estamos atuando de modo a criar estratégias no combate sistêmico ao processo de desinformação que já existe e, muitas vezes, é intencional e malicioso. É importante encontrar uma maneira para que o eleitor não perca sua liberdade de voto por conta de um processo de desinformação coordenado.
Como, então, vencer as fake news?
É difícil de responder de maneira assim tão simples. A desinformação, principalmente no processo eleitoral, sempre existiu de certo modo. O importante é como podemos amenizar, como podemos nos preparar para isso. A resposta, que pode parecer muito óbvia, é com o acesso à informação e com um sistema de educação melhor.
Ao mesmo tempo, dentro do ambiente digital, podemos trabalhar também no debate das instituições públicas num cenário tão fragmentado que existe hoje. Em nossa sociedade se formaram muitas bolhas. Falar com essas bolhas, comunicar uma informação institucional, muitas vezes é um desafio. No campo eleitoral, as instituições públicas precisam ter um protagonismo maior para amenizar [os efeitos das fake news].
Como fiscalizar os abusos?
Há diversas dimensões como isso pode acontecer. Os processos de desinformação podem acontecer eventualmente com um candidato acusando outro com mensagens difamatórias. Mas também pode acontecer com impulsionamento ilegal, contas inautênticas, de maneira estruturada configurando até abuso de poder econômico. Cada caso precisa ser analisado, mas é importante destacar que essa fiscalização pode ser feita por qualquer um. Há um aplicativo da Justiça Eleitoral chamado Pardal. Qualquer brasileiro que se deparar com algo nesse sentido pode realizar a denúncia.
A questão não é procurar controlar conteúdos, mas principalmente movimentos artificiais do debate público, uso de contas inautênticas, tudo que passa uma sensação artificial para um determinado debate em cada plataforma, sejam elas mais abertas ou menos abertas. Há diversas maneiras de informar e de desinformar. As instituições estão passando agora por uma necessidade de informar mais dentro desses espaços. Precisamos tornar esse ambiente [digital] mais saudável para o debate público.
Com o advento das redes sociais, podemos dizer que os algoritmos estão diretamente ganhando eleições?
Não acredito que os algoritmos sejam o único fator determinante. Esse tecido social novo que nós operamos hoje para discutir política e debater eleições é muito mais complexo do que o algoritmo. Ele envolve acessibilidade, a maneira e as plataformas a que se tem acesso, barreiras de linguagem. A internet conseguiu democratizar o acesso a muitas questões. É claro que os algoritmos são importantes dentro desse ecossistema e, de fato, eles têm comportamentos que precisam ser discutidos e debatidos, mas não acredito que regular algoritmos é um caminho.
Precisamos fazer debates de valores, de potencial de difusão de informação. Criamos comunidades online tão grandes e conectadas, maiores do que qualquer coisa que a gente já conviveu historicamente. O YouTube, por exemplo, tem 2 bilhões de usuários. Nunca houve uma nação com tanta população, uma igreja com tantos fiéis. Isso demonstra o poder de conectividade, de comunidade, que existe hoje nas plataformas. Elas têm de respeitar valores.
Qual a tática, então, para vencer a desinformação eleitoral?
O TSE atualmente tem uma rede de eleitores conectados digitalmente enorme [tanto em redes sociais como nos aplicativos referentes ao processo eleitoral]. Todos os apps [do TSE] têm uma audiência muito alta [neste período]. O que fizemos é que os eleitores conectados aos aplicativos vão receber informações precisas sobre o processo eleitoral. E acreditamos que, assim, eles estarão mais imunes quando receberem informações em massa, maliciosas. Estamos trabalhando para observar como a desinformação está ocorrendo nas redes para que a gente possa agir de maneira mais rápida possível para enviar essas notificações para milhões de brasileiros. No dia a dia, estamos observando a chuva de desinformação e estamos nos estruturando para fazer uma chuva de informação precisa, de qualidade, esclarecedora e, principalmente, que deixe claro como funciona o processo eleitoral.
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DW
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