O procurador Deltan Dallagnol enquanto ainda era coordenador da força-tarefa da Operação Lava JatoNum anúncio que pegou o meio jurídico de surpresa, Deltan Dallagnol, coordenador e o o rosto da força-tarefa da Lava Jato em Curitiba, divulgou nesta terça que está deixando a operação. De acordo com vídeo gravado, Dallagnol relata que está se desligando da força-tarefa para se dedicar a “questões de saúde em sua família”. “Há algumas poucas semanas eu e minha esposa identificamos sinais que nos preocuparam em nossa bebezinha”, disse ele, a respeito da filha de 1 ano e dez meses. “É uma decisão que tomo como pai”, avisou ele, lembrando que a Lava Jato “precisa de suporte” dos que apoiam a operação.
Com a saída anunciada, quem assumirá o posto de comandar as investigações do esquema de corrupção na Petrobras é Alessandro José Fernandes de Oliveira, procurador com mais tempo de casa na procuradoria do Paraná a manifestar interesse pelo posto, de acordo com o Ministério Público Federal (MPF) do Paraná. Dallagnol deve deixar o comando da operação em 15 dias, tempo estipulado para realizar a transição.
No vídeo publicado, Dallagnol diz que é hora de se dedicar a sua família. “Percebemos que ela teve uma série de sinais de regressão em seu desenvolvimento”, afirmou ele, sobre a filha. O procurador também afirmou que seguirá trabalhando como procurador da República, mas deixará de dedicar “horas extras” e “finais de semana” às investigações da operação. E aproveita o vídeo, de três minutos, para deixar um recado: “Se você apoia a Lava Jato, continue a apoiar. A operação vai continuar fazendo o seu trabalho, vai continuar firme, mas decisões que estão sendo tomadas e que serão tomadas em Brasília estão afetando o seu trabalho”.
Dallagnol se refere à ofensiva lançada pelo procurador geral da República, Augusto Aras, contra a força-tarefa, que coloca o futuro da Lava Jato sob incertezas. No mês passado, Aras afirmou que era preciso “corrigir os rumos” para que o “lavajatismo não perdure”. O recado foi duro diante da decisão que Aras precisa tomar até o dia 10 deste mês. É preciso o aval da Procuradoria-Geral da República (PGR) para a renovação da estrutura das forças-tarefas da Lava Jato, tanto de Curitiba, quanto de São Paulo e do Rio de Janeiro. Quem tem o papel de renovar é a PGR, que já o fez por sete vezes seguidas. Mas agora, essa renovação está em xeque.
Nascido em Pato Branco, no Paraná, Dallagnol ficou conhecido no Brasil todo quando tinha apenas 34 anos e personificou o afã nacional pela luta contra a corrupção desde que a Lava Jato começou a atuar, em 2014. As mais de 70 operações eram explicadas a exaustão pelo procurador de rosto jovial com sotaque do sul. Dallagnol seduziu o país com sua obstinação por mostrar resultados e acabou colocando Curitiba no centro do poder. Agora, aos 40, enfrenta um desgaste e a dúvida se a dose do veneno aplicado não passou de um limite que se volta contra ele.
Para além da queda de braço com a PGR, a imagem de Dallagnol foi desgastada com as relevações da série de reportagens Vaza Jato, abertas pelo The Intercept Brasil, que revelou diversas mensagens trocadas nos bastidores entre procuradores da Lava Jato e autoridades, dentre elas o ex-juiz Sergio Moro. Os diálogos e a identificação da comunicação entre Moro e Dallagnol colocou em xeque a imparcialidade da operação.
O procurador voltou a ficar contra as cordas este ano, tendo um de seus processos disciplinares votados no Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP). O processo foi aberto para investigar se houve ou não abuso de poder por parte do procurador no caso conhecido como Power Point de Lula. Na semana passada, depois de ter sido adiado 40 vezes, o julgamento ocorreu e o CNMP votou por arquivar o processo. No entendimento do Conselho, haveria elementos para a abertura de um processo e sanções poderiam ter sido aplicadas, se já não estivessem prescritas.
Dallagnol ainda tem dois processos disciplinares abertos contra ele no Conselho. Um deles investiga se o servidor tentou interferir na disputa pela presidência do Senado por meio de publicações em suas redes sociais contra o senador Renan Calheiros (MDB-AL). O outro era justamente um pedido de remoção apresentado pela senadora Kátia Abreu (PP-TO). Nele, a senadora argumenta que Dallagnol já foi alvo de 16 reclamações disciplinares no Conselho, deu palestras remuneradas e firmou acordo com a Petrobras para que 2,5 bilhões de reais recuperados fossem destinados a uma fundação da Lava Jato. Ambos os processos estão suspensos e o primeiro, sobre a eleição no Senado, prescreve no próximo dia 10.
Se num primeiro momento, a ânsia de Dallagnol e da força tarefa por promover mudanças no poder ganhou a adesão geral entre políticos, no momento seguinte parecia ter perdido a graça. A derrocada do PT do poder sob as denúncias da Lava Jato foi aplaudida por boa parte do Congresso, mas depois tornou-se um risco quando as operações começaram a avançar para os demais partidos.
A PGR, alinhada com o Governo Bolsonaro, tentou inclusive abrir os dados disponíveis com a Lava Jato. Em junho, Aras enviou a subprocuradora-geral da República Lindôra Araújo a Curitiba para que ela obtivesse todos os arquivos que constavam do banco de dados da força-tarefa. O procurador-geral da República chegou a dizer que em Curitiba havia “uma caixa de segredos” com dados de mais de 38.000 pessoas. O golpe foi duro e a procuradoria do Paraná reagiu, negando o envio dos dados e criticando a atitude. A disputa foi parar no Supremo Tribunal Federal (STF), que determinou, por meio do ministro e relator da Lava Jato na corte, Edson Fachin, que os dados ficassem onde estavam.
A exemplo de Moro, que saiu da magistratura e arriscou a vida política ao seguir para o Governo Bolsonaro, o próprio Dallagnol teria cogitado se candidatar, segundo reportagens da Vaza Jato. Sua justificativa sobre os motivos que o tiram da operação agora, porém, são sensíveis o bastante para explicar por que prefere fica longe de um ambiente tóxico em que a política e a justiça se encontram neste momento.
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Agência Pará
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